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Androids & Demogorgons

TV KILLED THE CINEMA STAR

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30 de Julho, 2018

Sense8: Juntos Até ao Fim

Sara

Para desgosto dos fãs de «Sense8», a Netflix derrubou dois dos seus 'mitos' com a série criada por J. Michael Straczynski e as irmãs Wachowski: o serviço de streaming também cancela séries e, apesar de já ter repescado várias canceladas (veja-se o caso recente de «Lucifer»), a audiência não verá as suas preces sempre atendidas. Ainda a poeira da segunda temporada mal tinha assentado, em 2017, e já a Netflix anunciava o fim prematuro de «Sense8», supostamente uma das suas apostas mais bem-sucedidas.

 

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A decisão apanhou muitos de surpresa, afinal a série tinha duplicado o orçamento da primeira para a segunda temporada – de 54 para 110 milhões de dólares – e a 'obsessão' dos espectadores nas redes sociais fazia augurar bons resultados. No entanto, quando isso não aconteceu, a Netflix bateu com a porta e deixou o aviso: os fãs não iam conseguir salvar esta série, já que as mais-valias não justificavam tamanho investimento. Apesar disso, o descontentamento acabou por levar o serviço a voltar parcialmente atrás, anunciando um último regresso para a despedida. Não é "seis temporadas e um filme", mas é alguma coisa.

 

Desde 2015 que «Sense8», apesar da sua premissa arriscada e complexa, parecia destinada ao sucesso. Tratava-se da estreia das mentes por detrás da trilogia «Matrix», Lana e Lilly Wachowski, no pequeno ecrã; e a abordagem despretensiosa de temas polémicos, aliada a uma narrativa irresistivelmente humana, conseguia cativar multidões por todo o mundo. Foi um grande voo seguido de uma queda com estrondo, que reforçou a ideia de que as séries mais caras da Netflix, como era igualmente o caso de «The Get Down», também são as mais frágeis. Trocado por miúdos, «Sense8» precisava de um sucesso ao nível de «A Guerra dos Tronos» para continuar a justificar a aposta estrondosa dos estúdios. Pois...

 

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Um filme que é uma 'fan-fiction' para os fãs

 

"Amor Vincit Omnia", o episódio de duas horas que escreve o final de «Sense8», é claramente uma carta de amor aos fãs. Embora a ação ocupe uma parte fundamental do argumento, já que seria inevitável concluir o arco de Whispers (Terrence Mann), a narrativa encaminha-se para uma 'lua cheia'. Bem ao seu jeito, «Sense8» despede-se com a mesma ousadia e desafio aos preconceitos que caracterizou a série desde o primeiro episódio. Os oito 'sensates' lutam contra o Mal, mas nas horas livres só querem ser felizes, certo?

 

Sun Bak (Doona Bae), Nomi Marks (Jamie Clayton), Kala Dandekar (Tina Desai), Riley Blue (Tuppence Middleton), Capheus (Toby Onwumere, que na segunda temporada substituiu Aml Ameen), Wolfgang Bogdanow (Max Riemelt), Lito Rodriguez (Miguel Ángel Silvestre) e Will Gorski (Brian J. Smith). São estas as oito personagens que compõem o 'cluster' de Angelica (Daryl Hannah) e protagonizaram uma história que, na sua realidade, é composta por milhares de indivíduos com os mesmos poderes – ainda que muitas vezes não se revelem. À boleia do seu regresso vêm também outros intervenientes, como Jonas (Naveen Andrews) ou Bug (Michael X. Sommers), e também uma peculiarmente irresistível Lila (Valeria Bilello).

 

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Paris, em França, é a protagonista em pano de fundo desta história, que atravessou vários pontos do globo desde 2015. «Sense8» chegou, inclusivamente, a marcar presença na Parada LGBT de São Paulo, no Brasil, em 2016 – um dos países mais audíveis na sua dedicação à série. Mas, no final de contas, em que outra cidade poderia acabar a história dos oito magníficos, senão na cidade do amor? A series finale de «Sense8» é, na sua essência, uma explosão das diversas emoções que compuseram a trama das Wachowski e J. Michael Straczynski, sem ficar a dever nada a si própria ou à componente de ação e mistério que foi 'complicando' a narrativa.

 

Não obstante, isto não quer dizer que o filme seja de menor qualidade. Até porque não estava comprometido com nada mais do que uma despedida digna, ao contrário do que aconteceria com o final em aberto da segunda temporada. Esta ideia vai ao encontro da certeza, confirmada por comentários dos envolvidos, de que "Amor Vincit Omnia" é para os fãs – foram eles que garantiram o renascimento das cinzas quando as portas foram todas fechadas. Fica também, com os diversos intervenientes na génese de «Sense8», o conforto e a realização de terem conseguido fazer uma série totalmente fora da caixa. E com a Netflix a lição de que não é só o dinheiro que move o sucesso das séries, pelo que a colocação da fasquia lá em cima, a roçar o impossível, pode ter consequências catastróficas. «Sense8» nunca conseguiria recuperar do investimento astronómico da segunda temporada, que abriu um fosso entre orçamento e audiência/lucro.

 

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Quanto ao desfecho propriamente dito, com as purpurinas e fogo de artifício a que tem direito, há uma sensação de copo meio cheio. Ainda que, como já foi defendido, não falhe relativamente àquilo que se propõe, a euforia ou desilusão com o resultado final vai depender de como a audiência lida com a vertente 'fan-fiction'. Isto é, com a clara intenção de os criadores agradarem os fãs, ao invés das personagens ou das ideias preconcebidas, para oferecer uma despedida 'good feeling' e com a sexualidade levada ao extremo, potenciando toda a natureza que tornou a série aquilo que ela é.

 

Pessoalmente, prefiro que a história esteja apenas comprometida consigo própria, com a ideia original e não influenciável dos seus criadores, e não com elementos externos, independentemente de ser capaz de agradar às massas. Veja-se, a título de exemplo, o caso de «Era Uma Vez» e «Arrow» que, embora nunca tenham assumido a manipulação da narrativa para dar resposta aos desejos dos fãs, entraram num ciclo do qual não conseguiram sair. Formaram-se casais, saíram personagens e forçaram-se storylines para corresponder ao que as audiências apregoavam nas redes sociais – não necessariamente a maioria, mas sim os mais 'barulhentos' –, privilegiando o marketing em detrimento da narrativa. Será que se pode falar em 'vitória' quando se perde tanto? Fica a questão.

 

 

Texto originalmente publicado na Metropolis.

 

 

 

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